sábado, 27 de novembro de 2010

Cronicolândia

As lândias — do inglês land — são mais conhecidas por estarem presentes em nomes como Neverland, Robot Land, Play Land, Conny Land.

É curioso como os países têm nome de parques de diversões: Groenlândia, Tailândia, Suazilândia, Nova Zelândia, Disneylândia. Sim, porque a Disneylândia ficou tão famosa e independente que já elegeu o Mickey Mouse como seu presidente.

Também é notável como os estados mais famosos do exterior sustentam essa mesma característica: Maryland, Queensland, Auckland.

Os brasileiros, certamente, não puderam ficar de fora. Embora não tenham conseguido acrescentar o sufixo lândia no nome do país, criaram cidades e bairros lândias com uma criatividade fora do comum.

O exemplo mais comum é a Brasilândia. Brasilândia vila, Brasilândia distrito, Brasilândia município... Só faltou alterarem para Brasilândia o nome da capital nacional.

Tem-se conhecimento também de lândias que ficaram no mínimo originais, aglomeradas ao nome do território. Açailândia seria a terra dos açaís? Recursolândia é onde a população vive entrando com recurso? Retirolândia é um lugar tão afastado como parece?

Quem pensa que para por aí está pensando errado. As lândias estão presentes nas cantoras de axé (Gilmelândia), em determinadas regiões (Cracolândia), nos discos de MPB (Viva a Brotolândia), nas revistas sobre estrelas de cinema (Cinelândia), nos programas de televisão (Zuzubalândia). Até em sites de jogos (Jogolândia) e nomes de empresas (Empregolândia).

Mas que fique claro: não existem parques de diversão apenas no nome; no Brasil, há também parques reais. Estes são chamados de PlayCenter, Hopi Hari, Beto Carrero World...

As lândias são estrangeirismos e só existem porque derivaram do inglês land. Agora, se já há tanto disso no Brasil, imagine na Inglândia!

sábado, 20 de novembro de 2010

Oscar Brasileiro

Se eu fosse um milionário ligado à imprensa, desenvolveria um projeto para premiar a melhor emissora de televisão brasileira. O troféu ficaria cravado em uma pedra e apenas a emissora realmente interessada em agradar os telespectadores teria capacidade de retirá-lo. Fico imaginando a disputa como se ela fosse acontecer hoje e tentando eleger a que deve ser considerada vencedora.

A primeira candidata, também número um na audiência, é notavelmente um globo, um círculo que não se desprende do conteúdo uma vez proposto. Culinária, desenho animado, jornal, novela, filme, culinária, desenho animado, jornal, novela, filme, culinária, desenho animado... Nada de criativo, nada de original, mas faz um clichê bem feito e atrai a maioria por isto: a qualidade no ruim.

A segunda candidata é um sistema blá-blá-blá de televisão. Diferente da primeira candidata, esta não tem início, meio ou fim. Os programas voam como vacas na visão distorcida de um bêbado. Também como vacas, que repetem suas atividades diariamente, a emissora exibe mais reprises do que programas inéditos. Com certeza é uma emissora que, se não ganhar o prêmio na primeira edição, não achará nada estranho tentar no próximo ano, tentar próximo ano, tentar no próximo ano.

A terceira candidata quis bater um recorde de inovação e acabou misturando um pouco das características da primeira com as da segunda candidata. Nessa, as vacas que se repetem giram em círculo e resultam num xérox — que a emissora insiste em garantir que foi autenticado em cartório e, por isso, é como se fosse original.

A quarta candidata investe em bandeirantes para explorar o ouro, sem perceber que já não há mais pedras preciosas nos lagos. O que é exibido tem uma perfeição indiscutível... para ter sido exibido há cinquenta anos. Os roteiros dessa emissora, provavelmente, sejam papiros ou livros de História que não contém nada de moderno e sedutor.

A quinta candidata é uma rede de tevê que cresce a cada dia, afinal é o povo que faz a televisão. A emissora defende que, para agradar o público, nada melhor do que deixar o público no ar. Sem jornalistas, apresentadores e demais profissionais realmente profissionais. A regra é: a voz do povo é a voz de Deus. Se é bonito e sabe contar piadas, que mal há em dirigir algo visualizado nacionalmente.

Há, também, as candidatas menores, que nem merecem o tempo dispensado para uma análise sobre elas.

Se eu fosse um milionário e tivesse condições de criar essa premiação, possivelmente, o prêmio ficaria preso por um bom tempo, já que ainda não existe uma TV Arthur, despreocupada com o dinheiro obtido através da propaganda e com uma programação de qualidade.

sábado, 13 de novembro de 2010

Relato de um Francês

As calças coloridas se tornaram moda entre os adolescentes; os cachorros de raças mescladas se tornaram moda entre as senhoras; o broche na gravata se tornou moda entre os executivos; a exportação se tornou moda na União Europeia. A Itália exportava vinho e azeite; Portugal exportava bacalhau; a Inglaterra exportava batatas fritas; a França exportava ciganos.

Oito mil ciganos — uns a mais ou a menos, a exatidão não importa nem para as estatísticas — tiveram suas moradias simpaticissimamente destruídas e foram amabilissimamente convidados a embarcar em um cruzeiro até a Romênia ou a Bulgária. Sem volta. Sem direito a recusa.

Desgostosos de tal evento, nos infiltramos clandestinamente em outro navio, eu e mais vinte, e seguimos com o medo na veia, mas a coragem na alma, orgulhando o sangue nômade e o espírito, ainda que decepcionado, francês. Representaríamos uma nova imigração francesa rumo ao mais extenso território sul-americano.

No Brasil, não houve preconceito com a nossa chegada. Ao contrário, parecendo se interessar pelo estrangeiro, os brasileiros vieram receber nossa trupe com buquê e champanhe. Depois nos levaram para tomar um café da manhã com baguete, croissant e petit gateau.

Éramos desconhecidos, mas o povo nos tratava como se fôssemos a Madonna fazendo uma turnê. As mulheres trocavam entre si os batons, os rimeis e até os sutiãs comprados na butique. As brasileiras se ofereciam para preparar um requintado suflê com chantili, desde que, em agradecimento, víssemos a sorte delas no tarô.

Na hora do almoço, tivemos até garçom, nos servindo o couvert: maionese e vinagrete. Depois se iniciou o bufê cheio de frufru, com coq au vin no início e mousse no final. Foi uma refeição livre de qualquer gafe.

Ainda no primeiro dia, um parceiro e eu, ambos solteiros, fomos a uma boate, na sessão da matinê, e conhecemos Biju, uma mademoiselle que usava muita maquilagem e desfilava, dançando balé, sobre uma passarela. Não preciso nem dizer que o dia terminou em um ménage à trois.

Conseguimos, em pouco tempo, um emprego como instrutor de esqui e, com dinheiro em mãos, nos sentimos verdadeiros czares. As mulheres quiseram ajudar, ocupando ofício de manicure e pedicure ou fazendo balaiagem e degradê nos cabelos alheios.

A Guiana Francesa que me perdoe, mas o Brasil se tornou oficialmente nossa segunda França. Importou pessoas estrangeiras; importou parte de nossas vidas; importou-se conosco. Posso não ser o ás da escrita, mas faço deste registro um dossiê.