sábado, 7 de agosto de 2010

Geladamente Tropical


O país não era um ser humano, nem um animal, nem um vegetal, nem nada que pudesse ser considerado vivo aos olhares da ciência. Literalmente, era apenas um extenso território de terra banhado por um oceano de um lado e por demais porções de terra do outro. Mas ele tinha vida e, consequentemente, sentimentos. O país possuía um coração.

O coração regulava a temperatura do país. Como as pessoas que nele habitavam eram extremamente afáveis uns com os outros, o país era tropical, com clima aconchegante até mesmo no inverno. Ao invés dos habitantes serem agradecidos por isso e prestigiarem as maravilhas do país, só sabiam listar defeitos.

Os defeitos não eram, de fato, imperfeições, mas resultado da insatisfação contida nas pessoas. A música, por exemplo, não estava suficientemente boa. O país tinha seu ritmo característico, tinha intérpretes fascinantes, tinha canções extraordinárias... Mas, aparentemente, as vozes internacionais soavam melhor ao ouvido.

A literatura sofria com o mesmo problema. O país era rico em talentos literários, mais de cinquenta mil títulos lançados a cada ano, a maioria de notáveis escritores. Só que a literatura estrangeira parecia mais gostosa de ler.

Com o cinema era igual. Os filmes melhoravam a cada dia: as comédias estavam cada vez mais hilariantes; os dramas, enternecedores; as ações, de tirar o fôlego. Os atores colocavam tanta emoção em cena que a ficção parecia a mais pura realidade. Porém, o cinema do exterior demonstrava ter mais efeitos especiais e por isso era mais bacana.

Até a comida a população desprezava. Para que comer arroz e feijão ou banana quando se podia devorar um suculento hambúrguer ou rosquinhas "donuts".

A saúde, a educação, o turismo... Em tudo havia qualidades, mas para as pessoas nada estava bom. Só focalizavam os pontos negativos de cada tema. Ninguém sabia, mas o país ouvia e reagia tristemente a cada comentário ruim.

Conforme as críticas destrutivas aumentavam, os sentimentos do país foram esfriando. O coração foi gelando e, inusitadamente, nevou no país. Às vezes, o país ariscava uns meios sorrisos, fazendo com que fracos raios de sol surgissem esporadicamente, mas o frio definitivamente imperava. O país sucumbiu ao inverno eterno.

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